Remo Brito Bastos, escritor e pesquisador, autor do recém publicado "Globalização, O Império da Miséria", pela Editora Vestseller. Detalhes em sua página profissionalwww.remo.adm.br .
Vivemos sob a hegemonia de um modelo social cujo motor é o consumo, o qual lhe empresta inclusive o nome pelo qual o mesmo é hodiernamente conhecido, sociedade de consumo. Neste tipo de sociedade, prevalece uma deturpação na escala de valores, pela qual os aspectos materiais se sobrepõem nitidamente aos aspectos humanos, ou seja: a excessiva estima que se confere ao material ou mesmo ao símbolo que o representa faz com que esses suplantem em importância, prestígio ou desejabilidade os valores fundamentais e essenciais ao homem, que deveriam ter prioridade em qualquer época e lugar, tais como solidariedade, compaixão, dignidade, liberdade, etc. Assim, o “sucesso” ou o grau de felicidade é medido pela quantidade e qualidade de bens e serviços que um indivíduo consegue consumir e/ou acumular, os quais se tornam parâmetros para se aquilatar o sucesso individual neste tipo de sociedade. E tudo isto independe de seu caráter e valores morais, os quais assumem um valor secundário nesse contexto social, pois o que importa é o ter, e não o ser, ou o parecer, e não necessariamente o ser.
Nessa busca desenfreada empreendida por este tipo de sociedade por resultados econômicos, o parecer constitui uma componente essencial e de suma importância para a escalada social do indivíduo. Uma das aplicações mais comuns para firmá-lo é a compra por parte de algumas pessoas de produtos que vêm a ser imitação ou falsificação dos “supostos” produtos originais, mesmo conscientes de que “estão levando gato por lebre”. Na verdade, essas pessoas anseiam por obter a satisfação no parecer, já que não conseguem ter nem ser.
Esse tipo de corpo social subsiste da ilusão de que o êxito material ou simbólico fornece a chave da felicidade humana. Não atentam, contudo, seus componentes, que as dimensões não materiais da felicidade — vida familiar e com os amigos, sentimentos de direção e controle de sua própria vida, autoestima, etc. — pesam muito mais do que as dimensões meramente materiais, e que as pessoas que não conseguem se realizar nessas dimensões procuram compensar a frustração através do consumismo desenfreado.
O sistema hegemônico mundial, a serviço das corporações transnacionais que lotearam o planeta, se sustenta exatamente atraves desta nociva macroestrutura, pois o estímulo material é o dínamo de toda essa engrenagem. O consumidor, na verdade, já é “fabricado” antes mesmo da concepção do produto, alienado que fica em relação ao produtor por fidelidade a um suposto “conceito de marca”, o qual perniciosamente dissemina o valor cultural (valor de signo) e o valor de troca em detrimento do valor de uso. Daí o ardil da idéia de moda, que condiciona as pessoas a acreditarem na diferenciação de certas marcas de produtos em relação a outras, vitimadas assim por uma dependência psicológica em relação a um diferencial que na grande maioria das vezes é meramente ilusório, fruto de um trabalho de marketing que aposta na emulação dos membros desse corpo social, ávidos por prestígio, requinte e reconhecimento.
O Marketing, por meio da propaganda, da publicidade, dos lobbies, da imprensa, de televisão, etc., tem, antes de tudo, a função precípua de controlar os espíritos, ou seja, as metes. É sua função criar “necessidades artificiais” e fazer com que as pessoas se dediquem à sua busca do inalcançável, cada um por si, isolados uns dos outros. Os dirigentes das empresas que o utilizam têm uma abordagem muito pragmática: “É preciso orientar as pessoas para as mesmas descubram suas necessidades", dizem eles, todavia, desde que essas “necessidades" sejam algo tangível e "vendável", ou seja, com as quais as empresas possam lucrar.
No próximo artigo, abordarei a moda e a marca, conceitos fundamentais na implementação desse danoso sistema, que aliena, subjuga e escraviza mentalmente e espiritualmente nossa fútil e artificial sociedade ocidental.
Continuação.....
Triste arremedo de sociedade- Sociedade de consumo - PARTE FINAL
Na semana passada abordei como o homem moderno tornou-se vítima de um sistema que lhe escraviza por destruir sua essência, em detrimento de fúteis signos. Encerrei o artigo prometendo para esta semana a análise dos dois conceitos fundamentais na implementação desse danoso sistema, a marca e a moda, pois tal sistema se baseia exatamente na emulação social, apanágio do homos economicus, do qual as empresas se utilizam para impor seus produtos.
O marketing se utiliza de “formadores de opinião” — atualmente mais conhecidos pela equivocada denominação de “personalidades” — ao mostrá-los usando produtos, ou melhor, se exibirem usando, sem de fato usarem, pois, na verdade, ninguem de bom senso acreditaria que Gisele Bündchen usaria alguma roupa comprada numa loja de departamentos popular. Assim são criados os “conceitos”, tão inocentemente assimilados pela maioria dos consumidores com o respeito e a deferência de quem está recebendo uma “importante informação”. Esses “formadores de opinião”, em sua grande maioria “fabricados” exatamente para essa missão, emprestam sua “imagem” anunciando produtos com os quais quase sempre inexiste uma correspondência direta com a sua área de atuação ou de aptidão técnica. Assim, a essas figuras públicas é atribuida pela mídia uma autoridade numa área especifica que na realidade, obviamente, elas não possuem, sendo elas mesmas meros instrumentos da engrenagem do marketing das empresas, “úteis” por curto espaço de tempo, constituindo-se igualmente em meros produtos efêmeros e que em curto lapso de tempo se tornam obsoletos.
Todo esse mecanismo depende fundamentalmente de duas ferramentas: a marca e a moda. À marca é destinada uma importante missão: suscitar a vaidade e a emulação nos consumidores, notadamente pela distinção conferida aos que ostentam objetos de marcas tidas como refinadas e exclusivas. Todavia, muitos consumidores certamente ficariam extremamente decepcionados se soubessem que a maioria dos produtos lançados pelas marcas mais famosas na verdade têm sua produção terceirizada a outras indústrias, geralmente localizadas no Terceiro Mundo, e que adotam condições aviltantes de trabalho e remuneração. Ao saber disso, como pode o consumidor “sentir-se vaidoso e reconhecido no meio social” por estar usando um produto de uma marca requintada, quando na verdade o mesmo foi produzido por outra empresa, no intuito de obter “condições mais competitivas”, entenda-se: salários indignos e outras do mesmo patamar de exploração? Assim, conclui-se que o consumo de uma marca requintada é, quase sempre, uma experiência enganosa e decepcionante.
Além disso, a marca não “decola” sem a moda, instrumento divinizado na atual cultura ocidental, o qual justifica o lançamento de inúmeros produtos. Esses muitas vezes guardam uma impressionante semelhança uns com os outros ou mesmo com versões do mesmo, anteriormente lançadas, todavia “aquele detalhezinho imperceptível” fornece “razões” para a produção de novas versões de milhões de quinquilarias que entopem as lojas comerciais e contribuem para o esgotamento dos já parcos recursos naturais de nosso planeta, abreviando nossa existência como espécie.
O sistema de moda se utiliza dos “formadores de opinião” para inventar frívolos significados culturais, que ameaçam inclusive os valores mais nobres da natureza humana. Essa manipulação da emulação social só se tornou possível com a utilização da moda como instrumento essencial para tal, pois não havia outra maneira de os fabricantes afetarem tão diretamente as vaidades e ambições dos consumidores. Poucas pessoas percebem tudo isso, pois a sutileza é quase perfeita e a maioria das pessoas acaba achando tudo isso “muito natural”. Tudo o que essas medíocres “personalidades” exteriorizam se “sacraliza” perante uma cativa e ingênua audiência, sempre ávida por mais e mais “lançamentos e conceitos”....pobres incautos: encantados e explorados. www.remo.adm.br
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